19 dezembro 2013

Então é Natal


Nesta semana eu fui a algumas lojas comprar presentes de Natal, e quando estava sentado, com alguns pares de sacolas nas mãos pensei no por que de tudo aquilo?

Era como se o tempo tivesse parado e eu estivesse ali, olhando as pessoas correrem de lá pra cá sem ser visto.
- Eu quero - dizia a menina de cachos negros sobre uma boneca que lhe agradava os olhos - eu quero!
E sobre quereres e desejos as pessoas assalariadas ou não percorriam os corredores das galerias, comprando quase tudo o que viam pela frente.
Eu, há apenas alguns minutos fizera parte de tudo aquilo, e sob a ótica sociológica julgava aquilo que faço parte.  
- Eu quero - dissera eu a mim mesmo, ao ver o eletrônico lançado há algumas semanas. 
Talvez, por fazer parte daquilo fiquei tão assustado, incrédulo. Querer, olhar, desejar, comprar... 
Sorri, e sob a ótica de quem se insere eu olhei as pessoas passarem apressadas. Era engraçado. 
Mas sem qualquer hipocrisia, não pensei em doar meu presentes para a caridade ou coisa parecida, não pensei numa maneira de mudar o estabelecido. Apenas sorri e caminhei alegre pelos corredores enfeitados, pensando que no próximo ano, quem sabe, eu pudesse fazer diferente.

11 dezembro 2013

Poder

Sob o viés da política e do poder. Não importa se é muito, se é pouco. Sempre falta respeito. 
Descaso, descabimento. 
Ando cansada disso. De estar no fogo cruzado, de ouvir valores que sempre se pisoteiam. 
Ando assim, quase que indo para um lado que não sei qual é. 
O poder me cansa, assim como me desatina o medo de chegar nele e repetir a trucagem, o desperdício; o desatendo e evidente cuidado em ser aquilo que condeno.

25 novembro 2013

A primeira vez

Te vejo arqueada, perceba, e te observo como quem olha o olhar alheio. Te tenho vontade e te engulo, estática, enquanto desfrutas daquele martini seco.
 
Foi assim que te conquistei, te pondo mais bebida no copo e te tecendo, aquecendo pelos seios abaixo. E com esta mesma ternura, te traí, sem a menor compostura descabida.
Não doeu, nem sequer fez cócegas, foi o que senti quando a tinha, a outra, sob minhas mãos geladas e sedentas. Eu a peguei no colo, a arrastei na noite, e juntos fomos capazes daquilo quem em 5 anos nunca tivemos, eu e tu. 

E te traí te amando, como nunca amei alguém. Mas o desejo, a carne, a vontade, nada disso pode esperar por mais tempo tempo. Por isso, quando ela me consumiu com gosto, queria te tivesse ali tu. Quando ela me engoliu, me despiu, se abriu, queria que tivesse sido contigo, conosco.
 
Mas não foi, porque tu te viras e te dormes, porque me dizes que tens nojo, porque em ti dói e nela não. 
E assim, deste jeito tolo e inconseqüente lhe ofereci um drinque, e ela tomou. Lhe apertei os seios, e ela topou, lhe cobri de beijos e ela gemeu.

Mas entenda, que queria vê-la assim, tu, arqueada em meus braços, minha. Mas não me deixas. E sob este corpo de carrasco, capanga nefasto, te escondo e te digo, que foi assim, a primeira vez dentre muitas das vezes que te traí.  

14 novembro 2013

Ode à raivinha

Não te invejo.
E tenho uma raivinha de ti,
destas que a gente conquista com o tempo.

Me incomoda o fato de me incomodares.
Nem por isso não te suporto.

E te julgo, te extinguo.
Te desprezo, te cogito.

06 novembro 2013

Os Imigrantes III


  Anna era enfermeira num navio, no tempo em que viajar por eles significava normalmente abandonar tudo e desembarcar num país desconhecido, em busca de esperança. 

  Mas Anna, Anna era mais que enfermeira. Cuidava também das angústias da alma e da lei. Sabia a quem pedir carimbos, passaportes, favores. Sob o olhar dela desembarcavam refugiados, cujos olhos cheios de medo refletiam aquilo que se chama por massacre. 
  E foi sobre as ruínas às margens do Danúbio que Anna viu pela primeira vez o braço de uma criança por baixo dos escombros e decidiu que faria diferente. 
  Forjava documentos, assinaturas, adoções, fotografias, laudos médicos. Nenhuma criança deveria ficar, nenhuma! E em conversas de porão recriava famílias, remexia parentescos. Na despedida, de longe, via tristeza e esperança nos olhos dos pais que ficavam, apenas para esperar as bombas que viriam a cair.
  Santos, Rio de Janeiro, Montevidéu. Os filhos de Anna se espalharam por essas cidades sem saberem, muitas vezes o rosto de seus verdadeiros pais. Se espalharam sem poderem deixar vestígios ou seguir rastros 
  Quanto a Anna? Ela mesma nunca desejou sem encontrada, vista, conhecida, reconhecida. Passou a vida de passagem até que um dia, de repente, ela não desembarcou. E sob o som da lenda, da sanfona e do violino diz-se que se desfez,
virou crista, onda e espuma do mar.   

29 outubro 2013

Cara minha.


Tentei te ligar e você não atende, não condiz, não sorri. Qual é a tua, minha cara? Que me convida e desconvida sem pudor qualquer?

Qual é a cara, afinal? Que me olha quando a vida te intimida e precisas de um favor?
Dissimulada, fragmentada, articulada, adorada. 

E diz, cara minha, qual é a cara que fazes quando ignoras o telefone e não lê minhas mensagens, quando perpetuas meu sentir?

Tentei te ligar, e você atendeu, tão doce quanto minha intimidade não é capaz de dizer. 

E com que cara te consigo ser grosso, te xingar, te chamar de vazia, se não com aquela que outrora te convido pra jantar.    



20 outubro 2013

Reticências

Meu amor, ela escreveu, acho que não gosto de você, gosto do que a gente tem. Colocou um ponto final, e depois outro e outro. Reticências.
Assim se encerrava o e-mail, que prefiro chamar de carta, pois trás um charme que e-mails não tem. 
Ela não queria contato visual, e preferiu a distância da pena, cujo mata borrão não escondeu a tensão de suas palavras. 
Meu amor, ela iniciou, será mesmo que te amo ou que estaremos assim, desgastados e perdidos, ainda que sucumbidos nesse desejo sedento que nos toca e desfalece?
Que haveria de oculto sob tamanha erudição? 
Que olhos teria ela quando me visse com um buque de rosas vermelhas prestes a serem entregues? Que diria ela sobre meu amor sereno que parece não tocá-la, sobre a voz tranquila que parece apenas atingí-la quando nossos corpos se encontram?

De repente acordo, e de fronte para ela, no café, sob a luz florescente de padaria ela completa em voz serena. Meu amor, acho que não amo você, amo o que a gente tem. E pontuou uma única vez. Era ponto final, era borrão, vadia... 

08 outubro 2013

Relações

É tão difícil lidar com as pessoas que a gente gosta. E quando não gostamos delas esse buraco, espaço, fenda, abismo...

Difícil tentar assim, desta ou daquela maneira. 
Difícil dizer, conviver, reviver. 
Relações mortas que a gente tenta animar. Ânimos fatigados que tentamos ressucitar
Amigos, amores, trabalho, tratores.
Até onde vai meu erro? Até onde a penumbra paira sobre mim e/ou sobre você?

Cansada tenho menos paciência, fatigada não me sobra jogo de cintura. 
Difícil lidar com meu espelho, difícil lidar com minha inveja, difícil lidar com minha personalidade.

Afinal, como conviver se abismos não se fecham, fendas não se costuram e buracos talvez se tapem.
Até onde é possível não deixar marcas e vazamentos?

01 outubro 2013

Sabores

Um gole de cerveja, de vinho, de Whisky, de coragem. 
João, Alberto, Pedro, Paulo, Marcelo, quem mais? Quantos mais? Por quantas noites?
Um gole de tesão, uma pílula de antídoto, um trago de orgasmo. Quantos seriam precisos, quantos rostos precisaria reconhecer, quantas bocas, falos, fossas?
Pequeno não satisfaz, grande machuca, médio, forte, fraco, ameno amargo, doce. 
Um gole de noite para tomar coragem de dia, um sono fatigado para justificar a preguiça, uma noite em claro para arrepender-se do incerto.
Maria, Marta, Ana, Clara, Silvia. Quantas mais? Quantos esconderijos mais? Quantos disfarces mais?

06 setembro 2013

Sentir

Não me sinto triste, mas me sinto só. Estranha sensação do vazio, de algo que se foi mas não machuca. 
Por que não pode ser assim? Por que a gente não pode simplesmente dizer ao coração o que deseja?
Mas me sinto quieta e leve, mas esse silêncio apenas me diz, que sinto só.

24 agosto 2013

Escolhas

Eu te amo, mas você não sabe e não saberá. 
Te amo e sempre será secreto, porque você não me olha, não me procura, parece não se importar. 
E por isso me afasto, me desmancho, me desjogo. 
Afinal, desisti de você antes de te procurar. 
Desisti porque existe uma caminho mais certo e mais confortável. 
Desisti porque tenho medo.
Mas quando te ouço, ao microfone, ao violão, aonde quer que seja, tenha certeza que errei. Que escolhi o possível que me faltou a coragem.  


Esteve engavetado por algumas semanas, meses, talvez anos. 

14 agosto 2013

Sobre Princesas e Reis

Hoje fez sol, e enquanto eu caminhava pela rua arborizada encontrei um amigo. Abri um sorriso e lhe dei os parabéns pela filha, que chegara há uma semana. 
Ele, bobo, prontamente me mostrou uma foto dela e disse com leveza.
- É a minha princesa. 
Princesa, ah princesa, que era eu há duas semanas, quando te visitava e você me recebia de braços abertos e bengala na mão.
- Minha princesa!
Princesa, cujos mimos reais não me cabia escolher, mas estavam no doce embalado para eu levar pra casa, na bola mais leve que não machucava ao chutar, no chinelo separado para eu calsar após o banho, no abraço, no beijo na não bronca; até mesmo quando eram meus os pés sujos que manchavam a parede recém pintada.
Princesa, cujo rei se foi numa manhã de sol, tão agradável quanto aquela que ele mesmo olhou pela última vez o mar, na praia de Atalaia, e se despediu de sua terra. 
Princesa, que nasceu e você cuidou como uma boneca, mesmo quando era teu corpo quem pedia cuidados.
Princesa...
Pena, penso. Pena reis assim não serem para sempre, pena que algumas manhãs ensolaradas às vezes amanheçam tristes. 
Mas hoje, hoje fez sol, e vi meu amigo apressado para chegar em casa e brincar com sua boneca, pronto para exercer a realeza. E foi neste passo rápido que ele se despediu, sorridente. Eu sorri em resposta, sem pressa e
saudosa. 
Afinal, sempre que nasce uma princesa, nasce um rei. Mas rei algum, mesmo quando se esvai, abandona sua princesa.

13/8/13


Finalmente a homenagem.


  
  

27 julho 2013

Desamores

  Hoje percebi que não estou apaixonado, que tua falta não me é buraco, que distante me sinto apenas carente, e por isso te procuro. 
  Não há frustração maior do que olhar os teus belos olhos e perceber que meu sentimento é vazio, que teu corpo me preenche mas não me aquece, que tua voz me é rouca e dispersa. 
   Mas ando, veja, tão desapaixonado que pulo daqui acolá procurando uma paixão que me cerque e me desarme. 
  Por isso quando te olho, menina, quero pensar que amanhã teus olhos serão mais verdes que são hoje. Quando te encontro, guria, quero pensar que te amo, como sinto que me amas. Quero pensar que te quero, que te caso, que te vivo, que não te frustro.

15 julho 2013

E pensar que isso era o nosso amor

Hoje deletei as tuas mensagens, e confesso que fiquei feliz. 
Feliz por me livrar desse resto que padecia no meu celular. 
Eu já tinha deletado algumas, hoje foram as últimas. 
Mas serei eu capaz de deletar as coisas que você me disse, o cabelo que você puxou? O dia que me jogou escada abaixo?
Deletei as fotos, joguei fora a rosa seca, aproveitei pra jogar no lixo os poemas que você disse serem para mim.
Mas serei eu capaz de deletar a fissura que me deixou, o estrago que me fez, os amigos que apaguei?
Eu deletei teus traços, mas não consigo te fazer sumir.. Porque você me machucou por dentro e por fora, de cima abaixo. 
E pensar que até ontem eu achava que teu tapa era nosso amor.


Baseado num depoimento qualquer da TV 

04 julho 2013

Cusparada

Ela cuspiu na minha cara. 
Nunca acontecera comigo antes, por isso não tive palavras. 
- Vadia - respondi pronto para dar-lhe um soco, mas a verdade é que mesmo enfurecido não tive coragem. Talvez porque ela tenha sido tão indiferente, tenha virado as costas e caminhado a passos estúpidos. 
Talvez eu tenha merecido a cuspida e por isso a coragem tenha me faltado no revide. 
Vadia, foi disso que a xinguei antes da cusparada, porque ela me empurrou e disse que não me beijaria nem que eu fosse o último homem do universo. 
Mas, por que, afinal, uma mulher de saia curta e bunda grande recusa um beijo e uma cantada?
Eu, eu devia tê-la pegado de jeito, encostado na parede e mostrado que sou macho. 
Mas ela, vadia, me empurrou com toda a força que teve, cuspiu na minha cara, ajustou o decote a saiu pé ante pé. 
Vadia, pensava enquanto limpava a cara entorpecida. 
Vadia, pensava enquanto me fingia ser mais homem, tentando truculento beijar outras bocas. 

25 junho 2013

Tempo

Preciso de um tempo, mas não sei quanto tempo. 
De um tempo pra refletir sobre porque as pessoas se vão.
Você se vai aos poucos, e não sei se choro, mas choro e não choro. 
Você me olhou, me criou, me abraçou, me sorriu, me mimou. 
Você se vai, vagarozamente rápido. 
E choro, porque dói.
E sinto, porque dói.
E entristeço, porque amo.
Preciso de mais tempo. Mas não sei quanto tempo.
Preciso de um tempo, porque o tempo passa tão depressa que a gente mal vê as pessoas indo. 
Preciso de um tempo a mais, mas não sei de quanto tempo mais preciso.

16 junho 2013

Vera

Ela é assim, se monta, se pinta, se veste. Mas na verdade, sob os cabelos ora loiros ora acobreados existe um sorriso inexistente, uma insegurança eminente, um choro contido. 
E chama-se Vera, e não gosta. Assim como não sabe se a franja lhe cai bem, mas a arruma precisamente ao tirar as fotos da rede social. 
Feliz, o sorriso da internet.
Vera costuma dizer que não consegue, diz também que não se fere. 
Vera tem vontade de trabalhar no emprego dos sonhos mas não vai. Diz não ter dinheiro e não alcançar, mas o tem. 
Vera é assim, na foto é bela e sorri, mas quanto mais se aproxima menos se vê.  Quanto mais sorrisos,  menos verdade, mais angústias. 

13 junho 2013

Entre coxinhas e tarifas

Respeito é pagar o preço justo pelas coisas. Pagamos caro em tudo, pela menor qualidade. 
Eu não me importo em pagar um real por uma coxinha meia boca e ruim no centrão. É barata, vem com pouco frango e muito óleo, mas é um real. 
Justa.
Eu não me importo em pagar 3,50 numa coxinha boa, bem recheada e saborosa. Justa.
Mas me importo em pagar 6,50 numa coxinha pequena só porque é do boteco "da moda". E porque todos os botecos no entorno do boteco da moda decidiram assim fazê-lo. E porque, então, todos resolvem aumentar o preço da coxinha.

Não me importo em pagar 3 reais pra pegar o metrô as 11h, quando vou sentadinha lendo meu livro ou dormindo. 
Mas me importo em pagar 3 reais quando sou saculeja, enfiada e cuspida pra dentro dos vagões (vagões mesmo, não carros). Até a soja viaja mais confortável que eu.
Me importo em pagar mais de quatro reais num ônibus que dá mihões de voltas para cumprir um trajeto e ainda só sai de 40 em 40 min, sempre lotado. 
Mas também não acho justo a passagem mais cara só porque o ônibus e mais confortável (como deveriam ser todos os ônibus) ou porque o metrô é sinônimo de coisa fina, que funciona na Europa e no caraleo-a-cuatro.


A tarifa, é somente mais um desses abusos diários que a gente vive e normalmente aceita. Mudar começa na coxinha, no consumo. Mas mesmo assim não tenho certeza alguma da mudança, dada a maneira como é sempre impossível conversar.

09 junho 2013

Desejo

   Eu gosto do seu abraço dengoso, do beijo lento que me preenche a alma, da tua mão suave que percorre minha nuca. 
Mas gosto, perceba, do meu cabelo puxado, de uma revoltosa agarrada, de sexo bem feito. 
   Difícil, neste mundo de princesas ou bandidas, se equilibrar. Difícil pra você, talvez, ler o gosto do meu desejo, a vontade do meu "pecado".
   Eu gosto do seu beijo lento mas preciso da tua boca ardente, ou me apago. Preciso do seu corpo quente, ou congelo, desfaço.  

30 maio 2013

Família

O que você pretende, me pergunto?
Que tipo de pessoa é você que alimenta a mãe como quem alimenta um cão de guarda, tirando a comida da sacola e jogando num prato sobre a mesa, sem dizer uma palavra sequer? 
Que tipo de pessoa é você que foge desde que me conheço por gente?
Que tipo de pessoa é você que vê a mãe chorando e dá as costas?  
Que tipo de pessoa é você, cujos olhos azuis esboçam um rosto frio, medroso, incapaz de olhar alguém nos olhos?
O que você pretende? A casa é sua, o dinheiro será seu.
Que tipo de pessoa é você, afinal, cuja crueldade sinto a cada passo, assim como a covardia, capaz de atirar, mas somente pelas costas. 

20 maio 2013

Virada Paulista

- Não fui à Virada e Sobrevevi. Já você, os olhos jazem sob um tiro por um celular.
Ela riu-se, desconfortada quando recitei. Não era piada. 
- Foram somente duas mortes para quatro milhões de pessoas.
- Afinal, celular a gente compra outro, o problema é sua alma, que não vale um vintém.

Fácil dizer quanto o tiro não é na tua cabeça. O celular não é seu, a bunda apertada é da outra.

Quando digo que não gosto de São Paulo é por isso. 
Porque não se pode relaxar. E não falo da virada cultural, que não fui esse ano mas adoro. 
Falo porque engarrafo no trânsito de olhos abertos e coração aflito. 
Falo porque não paro no sinal à noite, porque a cidade não para para eu passar.

E a gente se acostuma ao caos. Sobrevive. 
São Paulo é tão incoerente quanto o ricasso que paga caro para morar ao lado do esgoto Pinheiros. 
Tão incoerente quanto o favelado que joga esgoto no rio podre que corre à sua porta.
Tão incoerente quanto eu que não sei nem por onde começar por isso não faço nada. 

- Não fui à Virada e Sobrevevi!
Que frase patética! 
Já você finge que não é contigo quando alguém vai por um tiro por um celular.  

05 maio 2013

Belgrado

Eu olho as fotos de Belgrado na Internet pelo Google. Tentando encontrar nesta cidade algo que me pertence. Não há o que procurar. 

Em Belgrado, ou em Versaac, lá não soubrou ninguém. Nenhum sopro de vida
Minha tia, sem pesar as palavras disse que a guerra esfacela as famílias. Palavras de quem viu a sua própria se esfacelar.

Eu vejo as fotos de Belgrado no Google, uma a uma. 
Não sei o que dizer sobre a Sérvia, o que pensar sobre este país que a dezessete horas do Brasil. 

Me encheram de lágrimas os olhos ver minha tia chorar enquanto contava como seus pais fugiram das fazendas de café sob a mira de espingardas. Passaram a juventude fugindo. 
Quanta tristeza, ela disse medindo as palavras e engolindo o choro.

Olho as fotos de Belgrado pelo Google. O Danúbio não me parece azul. 
E quantos serão os corpos que jazem no fundo deste rio?

Eu choro, ao lembrar de uma história que não me pertence mas também é minha. 

Sabe, Belgrado me parece uma bela cidade e fica somente a 17 horas daqui. 

29 abril 2013

O peso do tempo

- O que o tempo faz com a gente? Me diz? - Ana Clara fitou os olhos negros e afundados do marido. 
- O tempo nos descama e nos isola - Ele respondeu desviando o olhar. 
Ficaram em silêncio por alguns instantes, ouvindo o murmúrio da televisão e olhando os organizados bibelôs e fotos acumuladas pelo tempo. Suspiraram juntos. 
- Quem será que vai primeiro? - Disse Ana Clara sem angústia.
- O que você prefere? - Ela não respondeu e continuou falando sozinha. 
- Sabe Armando, eu tenho medo de ficar só. Os nossos amigos de foram, dos velhos do bairro só sobrou a gente, e aprender tem ficado tão difícil... 
Armando refletiu alguns instantes, suspirou, ajustou os óculos no nariz largo, tomou impulso e levantou-se da poltrona. Num gesto lento aproximou-se da esposa, tocou com leveza seus alvos e ralos cabelos. 
- Sabe Aninha, como você fala mais, vai você primeiro então. Deixa que a solidão enfrento eu. Afinal, sem você eu devo durar um ou dois anos. Depois, o tempo passa tão rápido, logo a gente se reencontra. 
Ana desabrochou um sorriso e procurou o olhar do marido, desconcertada com a doce piada. Afinal, há quanto se conheciam? E Quem mais além do tempo seria capaz de fazer isso com a gente, me diz?

22 abril 2013

Pequenos Machismos

Assim como quase todas (os) nós sou cheia dos pequenos machismos (que ficam pra outro post) mas fico CHOCADA com os comentários de algumas reportagens que leio na internet. 
E vou citar um exemplo abaixo, sem muitas análises, apenas porque preciso compartilhar esta opinião.

E por isso pego como exemplo um caso bem atual. Vou falar da Suzana Vieira (70) e seu novo casamento com o Sandro Pedroso (29). 
Todo mundo sabe que a Suzana é idosa (pois é a partir dos 60 é idoso) e Sandrinho é um galã gostosão. Abaixo seguem dois comentários que extraí da notícia sobre o casamento deles. 


João da Silva: "ESSA IMBECIL merece mesmo pegar esses idiotas loucos para aprecer e arrumar uma boquinha na Globo....ela não aprendeu com aquele drogado que ela susentou por um tempo. Ela é idiota, ridícula e arrogante. ATRASADA É ELA COM A ARROGÃNCIA QUE LHE TOMA TODA A VIDA. Esse retardado que aceitou essa palhaçada não é macho....É CAPACHO !!!! 
APOSENTA COROA, VOCÊ JÁ ENCHEU O SACO POR MUITO TEMPO !!!"



Joana da Silva: "Essa SENHORA é a pessoa mais ridícula que eu já vi na minha vida... tem gente que ADORA fazer papel de IDIOTA... não só nas novelas mas também na vida real. ACORDA VÉÉÉÉIAAAA!!! SE ENXERGA!!!"


Agora vamos analisar os comentários de outro caso menos recente. O casamento entre nosso Vice-presidente da República, Michel Temer (72) e a modelo e vice primeira dama Marcela Temer (32). Atentemos para a diferença etária bastante semelhante a da Atriz global e seu companheiro. Acompanhemos os cometários da notícia:

João da Silva filho: "Minha dúvida Marcela, é: Se o Michel Temer, fosse aposentado do INSS ,ganhando um salário mínimo, voc teria casado com esse ancião? ou voce casou com a conta bancária dele? minha pergunta já foi respondida na última frase.!! HO,! CIOTADO.!!!! 


João da Silva neto:"Imaginem também...
Se o Ronaldinho fenômeno, o gaúcho, o Romário, o Pelé, e etc. etc. etc... Fossem serventes de pedreiro ou trabalhassem como borracheiros."


O que me choca é que ambos os casos parecem iguais: o mais novo está interessado no dinheiro/status que o mais velho pode lhe oferecer. Por sua vez o mais velho está interessado na beleza e juventude do mais novo.
Se  há ou não amor ou ele virá, não me cabe julgar. Mas, tirando-os como exemplo de muitos, pressupõe-se que é uma relação por interesse.
Então, porque nos dois casos a "vagabunda que não se dá ao respeito" é a mulher. Ainda que o cidadão do primeiro comentário deu uma chingadinha no Sandro, mas sobrou mesmo foi pra Suzana.... 
De verdade não entendo. Ora, pra mim me parece uma troca. Cada um ganha de um lado. Se é certo ou errado, isso é critério, é pessoal.Cada um com seus valores, e que sejam felizes.

09 abril 2013

Juliana

Juliana tirou a blusa e tocou levemente os próprios seios. Achou-os, murchos e sem graça. Pegou o celular e começou a tirar fotos de si mesma de fronte ao espelho, afim de encontrar um ângulo que lhe agradasse. Mas percebeu que não havia retrato cuja pele se mostrasse  lisa o suficiente.  
Prendeu uma flor nos cabelos crespos, mas ela não deslisou, não ornou, não lhe caiu bem. 
Afinal, porque nascera com os seios pequenos, o cabelo crespo, a voz tão aguda que lhe desagradava? 
Juliana, cujos olhos amendoados nunca saíam bem nas fotos, cuja boca rubra sempre permanecia apagada, cujos cabelos crespos, lisos, claros ou escuros nunca lhe seriam suficientes.  

01 abril 2013

Os Imigrantes II

Meu bisavó, conta minha avó, viu seu pai pela última vez no trem, balançando um lenço branco de adeus. Cada um tomara o trem para um lado, afim de lutarem numa guerra tão sangrenta que em seus nove milhões de mortos, levou um deles. 
Pedro, ou Peter, sobreviveu e desde aquelas lutas nas quais o sangue formava poças tão grandes que afundavam os pés, nunca recuperou a paz de espírito.
Ainda jovem tinha os ossos do rosto tão salientes que lhe encaveiravam a face. A guerra lhe deixara também os olhos vidrados, a garganta doente. Contudo, não lhe usurpara a beleza ou o dom de tocar sanfona.
Pedro tinha também uma tatuagem, mas a memória ou os traumas de minha avó não lhe permitem dizer o que havia nela. 

Eu, obviamente, não o conheci, mas sempre ouço que em sua casa os filmes de guerra eram proibidos assim como as palavras ofensivas, as armas, o desrespeito. 
De suas mãos desarmadas fazia-se o pão mais saboroso da Mooca, que vinha embalado em jornal até a mesa dos filhos em São Caetano.  
Na casa simples, de terreno largo, pomar e flores enterrou os anos de luta, a fuga e o sangue que ainda hoje escorre sob os tapetes das embaixadas. 
A Iugoslávia sempre fora o passado árduo, a saudade eterna. O Brasil fora sempre o exílio, a pátria, parte do trauma. Mas, afinal, que importava se não podia falar sua língua? Que importava se seria sempre o estrangeiro? Que importava o que ficou para trás.
Pedro era um homem forte e para ele importava apenas contar seus filhos vivos, proíbi-los de louvar a guerra e de serem fracos. Pedro era, era sim, um homem duro, cujo rosto fragilizou-se apenas quando deixou a vida, certo de que seus filhos nunca tinham visto um tiro sequer ser disparado sobre suas cabeças. 

13 março 2013

Se

quiser me falar, fale. Se quiser me olhar, olhe. Se quiser me sentir, tente.
Mas desta vez não espere de mim o primeiro passo, a primeira mensagem, o primeiro olhar. Afinal, cansei de chegar na frente, de dizer mentiras, de teatrar.
Se tem saudades, ligue. Se tem vontades, corra. Se tem palavras... diga.
Pois agora, fatigada e desaflita, apenas lavo o rosto a fim de tê-lo nu, deixando a quem quiser que me grite. 

02 março 2013

Turistar

Semana passada fui passear por São Paulo com uns franceses que conheci no aeroporto. Eles tinham acabado de vir do Rio de Janeiro e estavam super empolgados com a beleza das praias e da cidade. Comentei que eu, brasileira desde sempre, nunca fora ao Rio para passear, somente a trabalho, portanto nunca tinha ido ao Pão de Açucar.
A partir daí, e pelo desenrolar do assunto, me dei conta do que eu já sabia; que a última vez que entrei na catedral da Sé faz séculos, que minha última ida ao Masp foi pra ver uma exposição internacional, que não me lembrava mais da última visita ao museu do Ipiranga... Que desgosto, pensei por um instante amargurando minha não brasilidade. 
Afinal, isso é coisa de brasileiro, que não valoriza sua cultura. Afinal, eu também não conheço Amazônia e Pantanal.
Mas para minha (não) surpresa ouvi numa resposta bem humorada. "Eu nunca subi na Torre Eiffel, e minha última ida ao Louvre foi com a escola. Entrei na Notre Dame uma vez somente e foi porque um amigo foi me visitar em Paris. 
Esta resposta, tão óbvia, bem humorada e sincera me tranquilizou. Me fez relembrar que quando eu morava em Florianópolis ia principalmente aos lugares turísticos, quando meus amigos apareciam por lá. 
Por isso, sorrindo e tomando uma brasileira caipirinha no vão livre do Masp os franceses e eu chegamos a óbvia conclusão:  que na verdade a gente acaba sempre turistando por todas as cidades possívies, menos na nossa. 

24 fevereiro 2013

Algumas verdades


Amigo, você é um escroto que precisa de amigos, com o advento de ser gordo. 
Por isso, que fique claro, eu não me importo com seus problemas. Na verdade eu tenho problemas o suficiente para ficar encantada com os seus. Ah, se você lê três mil livros por ano e é PHD em física? Não ne importa também, pra mim você ainda é um gordo chato que fica me cantando pelo Facebook. 
Não, não tenho nada contra gordos, se você fosse magrelo e ao invés de PHD em física fosse PHD em cinema eu também não te beijaria nem que você ganhasse na Megasena. Sob essa última circunstância eu apenas assinaria um contrato de casamento sob união universal de bens na qual contato físico seria proibido. 
Sim, devo dizer que se você fosse bem chato mas fosse lindo talvez eu ficasse contigo por uma noite e postaria uma foto nossa no Facebook para aumentar minha própria auto-estima em relação à minha capacidade de ficar com caras lindos. O que não significaria que eu seria sua namorada. Afinal, aguento as besteiras que você diz por uma noite, mais que isso está fora das minhas possibilidades. 
Não se iluda, se eu recusei a sua cerveja, o seu café, a sua ida ao parque para ver os passarinhos é sinal que não vou sair contigo. Talvez eu aceite um convite seu para o Fazano, mais saiba que você pagará a conta e nunca mais sairei com você. E sim, eu terei a cara de pau de não lhe dar um beijo de boa noite e dizer que o problema é comigo, que estou insegura e que preciso de um tempo pra pensar.

18 fevereiro 2013

O futuro de verdade

O tempo, o sorriso, as fotografias, as mudanças. Quanto se guarda, se aprende, se vive, se relembra. 
Devo dizer que foi um bom tempo, uma bela aventura, um grande recomeço. 
Posso dizer que sinto mais viva, mais terna, mais confiante, mais astuta. Astuta a ponto de me fazer procurar aquilo que acredito ser melhor, a ponto de pensar que só é possível se mudar mudando. 
Penso que daqui para diante será futuro. Mais futuro que foi meu passado. 
É preciso mudar, mudar mesmo, é preciso olhar para frente e enxergar que pode ser diferente.
Não adianta simplesmente sonhar sem levantar os pés da cama em busca do amanhã. Afinal, há futuro para todos, basta acreditar que o futuro é possível. 

20 janeiro 2013

O tempo, as escolhas e os caminhos

Angélica abriu os olhos azuis e encontrou um fio de luz que entrava pela vaneziana do quarto. Era um domingo e ela não se lembrava quando fora a última vez que acordara sem o despertador. Talvez por isso tenha ficado algum tempo contemplando aquele feixe bobo de luz que escapava para o teto. 
Há quanto tempo não encontrava um tempo para si? Há quanto tempo não lia um livro sem pressa? Há quanto tempo não fazia nada pelo prazer da preguiça?
Angélica levantou-se, jogou água pelo rosto, sentiu os pés no piso gelado de cerâmica, olhou o celular. Viu que não havia mensagens e percebeu para aquele domingo não tinha nem trabalho, nem festas, nem churrascos. Era um domingo dominical, apenas.  
Angélica sorriu, optou por não ligar a TV, por reservar-se e tomar café sem interferências; afinal, há quanto tempo não ouvia o silêncio? Há quanto tempo não parava? Há quanto tempo não fazia escolhas? Afinal, por quanto tempo mais viveria na inércia?