08 abril 2015

Há não tanto tempo



Há algum tempo, que ironia, os tempos eram outros. Conversávamos, ainda que não fôssemos próximos. Mas o tempo fez com que as angústias se acumulassem, fez o ódio se alocar e as vozes se calarem. 

Me lembro do silêncio de meu avô, magro, alcoólatra, outrora falador e simpático.  Me lembro ainda que de tempos em tempos ele sorria, costumava, mas se perdeu, mesmo na sobriedade. Era um velho triste que entre um gole e outro se calava. Morreu mudo, e podia falar. 
O tempo, que ironia, lavou as lembranças e trouxe os traumas. A sujeira, abarrotada sobre o tapete transbordou. Aquela mágoa de repente era ódio. E aquele ódio novamente tornou-se silêncio, impondo-se e alojando-se nas almas de seus filhos. 

Às vezes, veja só, estou eu, cultivando também parte dessa mágoa, pensando em acertar a cara de alguém, arquitetando uma vingança imaginária. 
Bobagem, não vale.  
Não vale carregar, e me convenço para que não me consuma.  Não quero que me leve como os levou. Afinal, há algum tempo, não tanto tempo assim, conversávamos. Mas isso, isso foram outros tempos. 

4/2/2105