Sabe, eu tenho pena de você, apesar dos pesares. Pena mesmo. Afinal, os bons momentos de neta foram mais meus do que seus. Quando eu era criança, e todos eram saudáveis, você estava longe, distanciada daquilo que era tão bom: os jogos de cartas, as comidas saborosas, as conversas sobre o Baú da Casa Própria, as cambalhotas no colchonete que me fazia espirrar.
Você perdeu os aniversários cheios de gente, os Natais fartos, quando a gente não acreditava em Papai Noel mas acreditava que aquilo tudo era gostoso. Quando a gente esperava pela meia noite para ganhar um presente, um cartão, um beijo.
E depois de refletir muito sobre, depois que a ferida acalmou, consigo apenas pensar que sinto mesmo é pena. Porque ela está aí por uma disputa, que se transformou em ódio. Ela é uma peça que se mexe pra lá e pra cá, justificando o jogo amargurado.
Mas apesar de tudo, apesar de não achar certo ou justo, sei que ela sempre quis você por perto, que estava saudosa, que sua presença lhe faz bem. Espero que seja recíproco, que a presença dela faça bem a você, que você sinta o que é ter um colo por perto, uma história antiga a ser novamente e novamente e novamente contada.
E eu espero, sinceramente, que você possa sentir parte do que senti. Que nunca precise se despedir abruptamente, que nunca precise de uma ordem judicial para visitá-la, que nunca precise por a si mesma diante do tiroteiro, que você possa se libertar e ser também feliz.