25 janeiro 2011

A mulher encatadora

- Respeitável Público! - começou dizendo, com sua voz vibrante e rouca. Ajustou a capa, mantendo os olhos fixos na platéia em silêncio.
- Apresento-lhes a mulher mais encantadora do mundo! - O Mágico tranpassou a capa pelo vazio ao seu lado, mas sob o soar dos tambores nada apareceu.
- Nâo deixem que seus olhos os enganem, senhores, pois o encanto está no sentir - disse passando as mãos pelas coxas femininas que ninguém era capaz de enxergar.
- O sentir - continuou - este sim é que mais importa. – Num movimendo solene o mágico abocanhou a coxa, após deslizar mais uma vez os dedos sobre ela. Levantou o rosto vagarosamente em direção a platéia, buscando os olhares desconfiados de todos. Por seus lábios, antes pálidos, agora escorria sangue e devagar ele mastigava um pedaço da carne.
- A mulher encantadora precisa de cicatrizes - disse a voz reverberante – mesmo que ninguém possa enxergá-las - O público arregalou os olhos, mas mostrou-se visivelmente desacreditado do poder daquele homem. Era apenas um truque qualquer, diziam os burburinhos. O Mágico não se deixou abater, e pelas mãos fez sugir uma navalha diante do público agora atento. Aproximou-se do pescoço imaginário, cortando-lhe uma pequena fatia. Escorria sangue pelo ar. A platéia aos poucos delirava ao ver as mãos mágicas manchadas daquele líquido escarlate.
Encantador? Não? - Disse pausadamente encarando cada um que o assistia - Encantador...
Aos poucos as pessoas seguiam o mágico como uma serpente encantada segue a flauta, os olhos atentos em cada gesto dele, por mais sutil que fosse
- Quero ver o rosto encantado - Pediu uma voz da platéia. - Quero vê-la!
O Mágico pausadamente lambeu o sangue das mãos,
- Antes mesmo de vê-la é preciso sentí-la. – Advertiu.
As mãos dele percorriam um caminho pelo ar. Assim, surgiram os primeiros traços leves dos olhos dela . Sua boca, púpura, apareceu em seguida e a pele apresentou-se da cor e tonalidade ideal para qualquer visão.
O Mágico percorreu o palco, rodeou-a fazendo-a surgir vagarosamente.
- Encantadora você é... - susurrou o mágico ao ouvido dela, enquanto conduzia seu corpo e os olhos da platéia ao centro do palco. Os rostos estvam atônitos, incapazes de compreender porque não consguiam desviar o olhar daquela figura tão serena. Aos poucos o Mágico também parecia encantado, deslizando suas mãos incansavelmente pelo rosto dela.
As luzes se apagaram, e apenas um feixe iuminava os dois no palco. Ele abraçou-a por trás carinhosamente. Com a navalha abriu-lhe o peito delicado e tirou-lhe o coração ainda pulsante diante da platéia agora aterrorizada.
- Não há magia alguma. - disse cortando um pedaço do órgão e guardando em sua cartola. – Assim como não há encanto que dure para sempre. – O Mágico fitou novamente a platéia, seu olhar agora era desorientado, porém firme. Devagar, ele retornou à mulher, deslizou as mãos sobre seu corpo quase desacordado, repôs o restante do coração no peito. Com os olhos marejados deu-lhe um beijo na testa, levantou-se e cordialmente reverenciou o público. Ajustou também a cartola e num ensaiado movimento da capa se fez desaparecer.