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23 junho 2017

Quantas vezes


foto por: www.freepik.com
Quantas vezes você já colocou uma calça mais larga pra ir trabalhar porque ia pegar trem lotado?
Quantas vezes você já ouviu que era melhor contratar uma locutora porque daria mais credibilidade ao filme?
Quantas vezes a taxista já pediu seu telefone e já se ofereceu indiscriminadamente  pra subir no seu apartamento?
Quantas vezes vc já fingiu mexer no celular porque um mina "nada haver" resolveu te cantar na fila do supermercado do nada?
Quantas vezes já disseram que você merece ganhar menos sua carreira inteira porque quer ter filhos?
Quantas vezes você foi chamado de "delicioso, gostoso, tesão" ao passar na frente da obra?
Quantas vezes vc já deixou de sair de casa sozinho por ter medo de ser estuprado? 
Quantas vezes uma desconhecida já pegou no seu saco no transporte público como se fosse a coisa mais normal do mundo?
E sua bunda, já encostaram nela sem permissão? 

27 outubro 2015

Ser Mulher

Ilustração por Mari Fakih
O primeiro assédio que lembro, na verdade foi na rua, com um grupo de amigas. A gente  devia ter uns 11 anos, treinava handebol, e saia de camiseta e shorts para pegar o ônibus. Entre fiu-fius e gracinhas a gente ia pra casa, de ônibus, a pé, como seria possível. 

Mas o mais escandaloso, ao meu ver, foi um professor de matemática que tentou sair comigo. Eu tinha 16 anos, estava no colégio, ele devia ter uns 40. Era até bonitão, malhado, um tipo OK,  mas lembro que fiquei enojada e confusa. Não saí com ele, mas não denunciei ou contei para ninguém. Apenas passei e evitá-lo. Talvez porque aos 16 a rua já tivesse me ensinado que eu era deliciosa, pernuda, bundão e que isso era "assim mesmo". Talvez porque também foi aos 16 que, enquanto eu corria, indo e voltando na avenida, um cara resolveu bater uma punheta e quando passei novamente por ele disse que era pra mim. Depois daquilo por anos minhas corridas tornaram-se restritas aos parques, com guardas e grades, onde me parecia mais seguro. 

Não me lembro a idade, mas já apertaram meu peito no amontoado do trem, depois daquilo aprendi a andar sempre encostada nas paredes do vagão, a andar de cara fechada na rua enquanto caminho sozinha, a tantas outras coisas. 

E isso não para, pois esses dias, quando fui pegar ônibus, havia um grupo de homens no ponto, talvez conscientes, legais, mas tive medo. Por isso esperei de longe, olhando para trás a cada segundo. Quando o ônibus chegou dei sinal de longe, e corri até o ponto, passando rapidamente por eles.
Pequenas "infrações sem sinal de violência" que toda a mulher passa. Que ao longo de anos me - nos - deixaram escolada. Afinal, começa quando a gente ouve fiu fiu a cada esquina; de shorts, de decote, de vestido longo, de calça, de burca. E na verdade a gente precisaria responder e chingar, e gritar, e denunciar; mas como, se a gente tem medo, se tem a certeza da impunidade? Medo porque somos assediadas por professores, por chefes, por motoristas de ônibus, por tantos lugares. Medo porque aprendemos que é "normal", que simplesmente é assim. 



Conheça mais do trabalho da Mari Fakih aqui: https://www.facebook.com/Fakih-Maa-280527268763501/