Silenciei, veja só, quando percebi que não havia palavra que lhe pudesse fazer sentido.
- Aceita. - Ele me disse seco, mas não rude. E silenciei, como já disse, e não respondi aquilo que ele merecia ouvir. Dei as costas e deitei-me na cama, ocupando todo o espaço que fosse possível. Fiquei lá até anoitecer, até que ele viesse me buscar do transe.
- Me deixa - resmunguei enquanto ele tocava com leveza meu ombro gelado. Ele insistiu, e senti sua mão negra e forte trazer para trás meus cabelos com delicadeza.
- Você precisa reagir - fez uma pausa - pois ninguém pode fazer isso por você. Eu me virei, lentamente, encarei aqueles olhos escuros em silêncio.
- O que você sabe sobre o que eu sinto? Sobre o que sente uma mãe? - Ele hesitou, vi raiva nele, mas respondeu com calma
- O que sabe você sobre o que sente um pai? - Eu me levantei num pulo, nauseada, jogando a mão dele pra longe. Fui ao lavabo e vomitei tudo o que poderia haver dentro de mim. Não havia sangue, mas desejei que houvesse. Manuel não me acompanhou ao banheiro, deixou que eu vomitasse, praguejasse, chorasse.
Fiquei ainda um tempo no banheiro, sentada no piso frio contando os azulejos até que me veio a coragem. Apoiei as mãos no piso e levantei, joguei água no rosto, olhei a mim mesma no espelho e segui olhando. Era preciso.
Caminhei de volta ao quarto e encontrei Manuel pousado em nossa cama, inerte e moribundo da maneira que o deixei. Percebi que os olhos pretos estavam rasos, quase vazios.
- Aceita - eu disse quieta ao seu ouvido, quase num sussurro. Ele se virou para mim, me entreolhou e quase sorriu. Silenciamos juntos, abraçados mas distantes. Pois aquela dor, aquela dor irremediável era só minha e só dele.
- Não contesta - dissemos - apenas reage, aceita.
Nenhum comentário:
Postar um comentário