São pequenas coisas que me despertam: os cheiros, as cores. Vejo este rio sujo sob mim, com o qual cruzo todos os dias. É como olhar a mim mesma, meu reflexo borrado sob as águas fétidas do Tamanduateí. As vezes penso em me jogar, mergulhar de vez, me deixar cair e cair e cair...
A cidade à noite me convida. Tenho vontade de encontrar-te lá embaixo, sob as ruas de onde brotam os demônios escondidos nas ruínas abandonadas.
Vejo os prédios, as pessoas moribundas se arrastando sob ternos ou chinelos afim apenas de viver. Sobreviver por este mundo que não é nosso, cujas nossas horas vivem esmagadas no trem lotado, cujas as almas padecem comprimidas sobre os trilhos.
Abro os olhos, respiro. Me falta o ar e o pouco que vem ao pulmões cheira a cinzas. Tosse os alvéulos o velho a meu lado, engasga-se a criança.
Comprimo as mãos sob as barras de ferro. Nelas há suor, sangue, fragmentos.
Lá embaixo a cidade convida, prédios abandonados, lodo, bares, portas de madeira podre.
Dizem que ao sol despertam as cores, mas daqui enxergo apenas o rio, os restos, as carcaças.
Houve um tempo em que havia alma, hoje sequer enxergo as carniças.
Abros os olhos outra vez. Respiro e padeço, vendo apenas aquele rio morto, com o qual meu reflexo tosco insiste em cruzar todos os dias.
Um comentário:
que bosta hein...
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